quinta-feira, 17 de junho de 2010

- Oi meu grande amigo, você está bem? - Falei para meu colega de quarto, num sorriso aberto e amarelado.
- Hmmmm, fala! o que foi? - Disse ele num tom pouco amigável. Eram perto das 8 da manhã e estávamos nos preparando para ir para nossas aulas. Eu de Política III e ele de Cálculo B.
- Bem... eu é... finalmente consegui que a Michele aceitasse sair comigo.
- Que ótimo! - Disse ele, abocanhando uma fatia de pizza que tinha sobrado de alguma janta da semana.
- Sim, isso é muito bom, mas eu preciso de tua ajuda...
-NÃO! De jeito nenhum. Eu não vou sair com a Luz! Não quero saber se a Michele quer arrumar uma companhia para a sua prima monstro. Não vai ser eu. De jeito nenhum.

Florianópolis, Junho de 1996.

Éramos jovens e felizes. Tinhamos descido na rodoviária com apenas uma mochila e uma pasta carregada de ilusões. Companheiros inseparáveis desde a infância, apenas o vermelho me separava daquele coração preto e azul. Crescimos na pacata cidade de Guaíba. Tinhamos conhecido a Oswaldo Aranha juntos e perdido a virgindade no mesmo dia, e com a mesma guría. Tinhamos lutado por uma vida melhor e por sorte do destino, os dois estávamos fazendo a mesma faculdade. Só que, como sempre, Danilo escolheu para seu futuro ser ingenheiro. Eu, como em toda minha vida estudantil, tinha caído para o lado das ciências humanas e considerava interessante ser membro do Diretório Central dos Estudantes e freqüentar a Universidade como aluno de Ciências Socias. Mas hoje, depois de tantos abraços, risos, fumos e choros, tinhamos um novo problema. Ele não queria encarar a Luz, ou como chamávamos ela carinhosamente, o Carro Monstro.

A Michele deve andar sempre com a Luz para realçar a beleza dela, costumava dizer Breno, nosso vizinho maluco. E talvez ele não estivesse tão errado. Ele trabalhava num sebo na Fernando Machado e tinha me conseguido um exemplar de Ana Karenina , e praticamente todos os dias, aparecia por volta das 20 depois de jantar com um baseado para zelarmos a noite. Eram tempos difíceis e aquela união nós fazia passar mais amenamente o frío inverno.

"Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira"

Mas aquela manhã de sexta-feira, o Danilo simplesmente precisava aceitar. Eu não podia não conseguir que ele faça isso para mim, já que meu plano B, o Breno, estava indo para Cruz Alta ver um primo que tinha sido atropelado, e expliquei isso ao meu colega de quarto. Só que ele tinha argumentos fortes.

- Olha meu amigo, quero muito que tu enrabe a Michele, de coração mesmo. Só que eu não posso me expor com aquele dragão na rua. Eu estava ficando com a Priscila até uns dias atrás, imagina o que ela pensaria se me visse saindo com vocês três? Certamente ela não ia querer me ver no domingo...

- Vamos num lugar escondido, Vamos para Coqueiros! eu Alugo um carro! - Se esse era o problema, já tinha solucionado.

- Não não... já te falei, é complicado para mim. Me desculpa. - acabando a fatia da pizza e jogando a massa sobrante pela minúscula janela encima da pia.

- Eu te dou Vinte reais! Pago tudo de vocês! - Estava quase chorando, realmente precisava daquele infeliz de cabelos loiros e olhos azuis. Era minha única chance de tentar descolar uma transa com a menina mais bonito que conhecia.

- Tudo isso, mais o Loco Live e o Appetite For Destruction.

- Filho da puta! vou te fazer engolir tuas bolas! - gritei indignado

- Então nada feito.


E foi assim que aquele infeliz me roubou meus dois LPS favoritos. E sabem do melhor? eu saí com eles naquela noite. Fomos para a beira-mar de Coqueiros. Bebi tanto que acabei desmaiado na areia. Quando acordei, algumas horas depois, abri os olhos e dei de cara com o rosto gordo e dormente da Luz. Patético.

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