Merda. Merda. Merda. Foi o que pensei quando soube da verdadeira identidade do sujeito que estava sob nossa tutela há quase três dias. Jucélio Gomes, professor adjunto não era Silvio Gonçalves, aquele militar quarentão que tanto queríamos torturar.
Estávamos apenas o Chileno Piñata, Pedro e eu. Quando soube do engano, Sílvia começou a chorar e se enfiou no único quarto da casa. Talvez o remorso por haver decepado o dedo anular da pessoa errada foi muito forte para ela.
Que merda. Torturamos a pessoa errada cruelmente por duas noites seguidas, sem dar atenção às súplicas que o rosto agora quase desfigurado urrava. Cada soco, chute ou tortura foi para um pai de família, trabalhador talvez. A verdade veio a tona quando descobrimos a foto que ele guardava dentro do bolso interno da camisa. A tal foto datava de quase um ano atrás e retratava o rosto feliz de Júcelio, junto às duas filhas que tanto gritou nesse pouco tempo em nossa companhia.
O cheiro de urina e fezes era muito forte nessa sala e realmente me envergonhou fazer parte do equívoco. Nossa falta de experiência em ditas ações pecou e destruiu a dignidade de um jovem que talvez achava nossa luta certa. Que baita merda que nós fizemos.
- Hay que matarlo. Disse secamente o chileno. Todos nós sabíamos disso, mas a vergonha congelou nossos atos. O silêncio daquela cena era aterrador e no fundo, aquele velho rádio que tinha ganhado da minha tia no meu aniversário de treze anos tocava, por ventura, meu verso favorito do José Larralde:
"El que no sabe dónde anda que no agarre una guitarra.
Cuánto me costó encontrarle la razón de su arrogancia
si hasta sentí compasión de algún rajón sin distancia
que le cruzaba la espalda,
como si una rastrillada le hubiera mordido el bofe
pa que ya no respirara."
No fundo de nossos pensamentos sabíamos que a revolução estava perdida mas esse tipo de ato talvez despertasse a chama apagada da sociedade. Só que falhou. Falhou e o que realmente conseguimos foi destruir nossas almas, nossa ideologia e nosso espírito.
Não sei quanto tempo ficamos parados sem tomar atitude nenhuma, ouvindo apenas o choro daquela pessoa que estava ciente que iria morrer, e num momento assim, vencido pela própria dor e pelo medo, ansiava pelo momento que nenhum de nós tinha coragem de
A cena pareceu passar em câmera lenta. Pedro segurou seu revolver 38 e, numa distância de menos de 2 metros, acertou o crânio de nosso agora inimigo. Inimigo da sociedade e da vida. Inimigo da nossa revolução. Inimigo de nosso erro.
Ouvi tudo. Ouvi o barulho do projetil rompendo com a pele e a conjuntura óssea. Ouvi a respiração do homem parar. Senti o cheiro de pólvora no ar e no fundo, me senti aliviado por ele não sofrer mais do que sofreu.
Nessa curta distância, o tiro abriu um buraco do tamanho de um palmo na cabeça do Jucélio. Fragmentos de massa encefálica caíram nas cerâmicas brancas da sala. O sangue começou a jorrar rapidamente pelo cadáver e senti que ela estava sujando todos nós.
Ficamos em silêncio e congelados por bastante tempo. O chileno quebrou a cena acendendo um cigarro e sumindo da sala. Pouco me importava onde ele estava indo. A nossa guerra estava perdida.
Estávamos apenas o Chileno Piñata, Pedro e eu. Quando soube do engano, Sílvia começou a chorar e se enfiou no único quarto da casa. Talvez o remorso por haver decepado o dedo anular da pessoa errada foi muito forte para ela.
Que merda. Torturamos a pessoa errada cruelmente por duas noites seguidas, sem dar atenção às súplicas que o rosto agora quase desfigurado urrava. Cada soco, chute ou tortura foi para um pai de família, trabalhador talvez. A verdade veio a tona quando descobrimos a foto que ele guardava dentro do bolso interno da camisa. A tal foto datava de quase um ano atrás e retratava o rosto feliz de Júcelio, junto às duas filhas que tanto gritou nesse pouco tempo em nossa companhia.
O cheiro de urina e fezes era muito forte nessa sala e realmente me envergonhou fazer parte do equívoco. Nossa falta de experiência em ditas ações pecou e destruiu a dignidade de um jovem que talvez achava nossa luta certa. Que baita merda que nós fizemos.
- Hay que matarlo. Disse secamente o chileno. Todos nós sabíamos disso, mas a vergonha congelou nossos atos. O silêncio daquela cena era aterrador e no fundo, aquele velho rádio que tinha ganhado da minha tia no meu aniversário de treze anos tocava, por ventura, meu verso favorito do José Larralde:
"El que no sabe dónde anda que no agarre una guitarra.
Cuánto me costó encontrarle la razón de su arrogancia
si hasta sentí compasión de algún rajón sin distancia
que le cruzaba la espalda,
como si una rastrillada le hubiera mordido el bofe
pa que ya no respirara."
No fundo de nossos pensamentos sabíamos que a revolução estava perdida mas esse tipo de ato talvez despertasse a chama apagada da sociedade. Só que falhou. Falhou e o que realmente conseguimos foi destruir nossas almas, nossa ideologia e nosso espírito.
Não sei quanto tempo ficamos parados sem tomar atitude nenhuma, ouvindo apenas o choro daquela pessoa que estava ciente que iria morrer, e num momento assim, vencido pela própria dor e pelo medo, ansiava pelo momento que nenhum de nós tinha coragem de
A cena pareceu passar em câmera lenta. Pedro segurou seu revolver 38 e, numa distância de menos de 2 metros, acertou o crânio de nosso agora inimigo. Inimigo da sociedade e da vida. Inimigo da nossa revolução. Inimigo de nosso erro.
Ouvi tudo. Ouvi o barulho do projetil rompendo com a pele e a conjuntura óssea. Ouvi a respiração do homem parar. Senti o cheiro de pólvora no ar e no fundo, me senti aliviado por ele não sofrer mais do que sofreu.
Nessa curta distância, o tiro abriu um buraco do tamanho de um palmo na cabeça do Jucélio. Fragmentos de massa encefálica caíram nas cerâmicas brancas da sala. O sangue começou a jorrar rapidamente pelo cadáver e senti que ela estava sujando todos nós.
Ficamos em silêncio e congelados por bastante tempo. O chileno quebrou a cena acendendo um cigarro e sumindo da sala. Pouco me importava onde ele estava indo. A nossa guerra estava perdida.
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