domingo, 23 de setembro de 2012

Descompasso


Aos 20 anos, a figura dela era formidável. Suas curvas eram dignas de modelo porémseu olhar ainda remetia ao mistério. Silêncio no salão. Apenas a fumaça de um solitário cigarro que sequer tinha a companhia de um cinzeiro. O tempo parecia não passar mas todos os dias minha idade parecia dobrar. E eu tinha quase 70 reais no bolso da minha calça jeans velha.

Antes de subir para o apartamento dela, no oitavo andar de um prédio perto da praça central, entrei no mercado ao lado e comprei uma garrafa de rum. Acabei me distraindo com duas crianças descalças que brincavam sorridentes com tampinhas de refrigerante. Acendi um cigarro novamente no silêncio do fim de tarde.

O elevador estava estragado e subi os oito andares por escada. A porta do apartamento estava aberta. Ela se encontrava de costas a mim, mas sabia que esperava por mim. Estava escuro já e somente uma luz fraca emanava da janela ao lado. Ficamos em silêncio até o telefone tocar. Ninguém atendeu. O telefone tocou por vários minutos de forma ininterrupta.

Acabei sentando no sofá. Ela continuava de costas. Um soluço. Dois soluços. Chouro. Abri a garrafa e tomei um gole generoso. Não ofereci nada ao mundo, quanto mais a ela que tão bem tinha me feito sempre. Chorei ao pensar nisso.

Já eram às três e cinqüenta da manhã. Falei adeus, me levantei e desci os oito andares por elevador. Nunca mais vi ela na minha vida. Nunca mais consegui amar alguém.


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